Leopoldina entre o passado e o presente

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Eduardo Fiora

Da barbearia que leva o seu nome, está instalada na Rua Paulo Franco quase esquina com a Rua Schilling, João Batista de Souza 60 anos, acompanha o acelerado crescimento da região da Leopoldina, principalmente no perímetro da Vila Hamburguesa. Com o olhar centrado no presente e o coração viajando pelos anos 60 e 70, ele afirma emocionado: “Todo esse entorno tinha um ar de interior. Era aquele ambiente de família, de amizades estreitas. Isso ainda existe aqui, mas o progresso vai tornado as relações mais distantes. As pessoas mudam para o bairro, porém demoram a interagir com ele”.
Nascido em Itamogi, no sul de Minas Gerais, João, desde menino conviveu com esse ambiente interiorano. Sua infância foi vivida no campo, ao lado da família, proprietária de uma pequena lavoura de café. “Num determinado momento, meu pai concluiu que já não era vantagem ser agricultor. Como ele tinha amigos que trabalhavam em São Paulo, decidiu mudar de vida e arrumou emprego num frigorífico na Zona Oeste. Como tínhamos parentes em Santa Bárbara D´Oeste eu resolvi ir para lá”. E foi em Santa Bárbara que ele aprendeu o ofício de barbeiro com os amigos, especializando-se na profissão no período em que morou em Santos. “Lá eu fiz um curso técnico, em 1965. Dois anos mais tarde vim morar na rua Paulo Franco. Como a rua Schilling já existia um movimento comercial, achei que esse seria um bom local para trabalhar como barbeiro. Aos poucos fui conquistando minha clientela, até que surgiu a oportunidade de um ponto mais amplo, na própria Paulo Franco, onde estou desde 1992”.

Romaria e futebol

As lembranças de uma Leopoldina e Hamburguesa interioranas rendem uma descontraída e gostosa conversa. Segundo João, até os anos 80, a rua Schiling era palco de uma procissão de romeiros que, em caravana, seguiam para Bom Jesus de Pirapora. “Eles vestiam trajes típicos, desfilando a pé ou montados em cavalos. Tinha até charrete. Era um bonito espetáculo”.
Ao apontar em direção ao Sesi da rua Carlos Weber, o barbeiro resgata um dos aspectos mais singulares da vida de um bairro: o futebol de várzea. “Nesse enorme terreno onde hoje funciona o Sesi Leopoldina, a comunidade se reunia para acompanhar os campeonatos de futebol, com clubes locais e times vindos de outras regiões. De vez em quando eu arriscava a bater bola, mas não era daqueles que levavam a sério esse esporte. Em compensação eu tinha amigos, em times como o Bela Aliança, que encaravam as disputas como verdadeiros campeonatos profissionais. E ainda tinha o campo do Botafogo na Avenida Imperatriz Leopoldina. A comunidade vinha junto. Os jogos, aos domingos, reuniam centenas de pessoas”.
O cenário de hoje, no perímetro urbano da Leopoldina coloca o bairro no rumo de uma verticalização altamente valorizada. O valor do metro quadrado das recentes edificações na rua Carlos Weber já está valendo R$ 3 mil. “Esses novos moradores, que nos horários de pico enfrentam congestionamentos ao atravessarem de carro as pontes da Marginal rumo à Hamburguesa ou City Lapa, nem imaginam o que era cruzar o rio, na altura da ponte do Piqueri. Não existia esse eixo viário. A ponte era de madeira, sustentada por tambores flutuantes. Atravessá-la era uma verdadeira aventura”.
Quem hoje escuta com atenção todas essas lembranças do barbeiro leopoldinense é um fiel companheiro de família e de ofício: o filho Fábio 28 anos, que trabalha no salão do pai há 10 anos. “Ainda garoto, aos 18 anos, ele decidiu fazer um curso profissionalizante. Agora está aqui comigo e é muito competente no que faz”, afirma, com orgulho João Souza. Trata-se daquela antiga história dos segredos que vão de pai para filho. “Muito do que aprendi foi na base da observação do trabalho de meu pai, algo que acompanhei desde menino, pois nasci aqui na Leopoldina”, conta Fábio Souza. “Com o curso técnico eu me especializei, mas sempre contei com as dicas de um verdadeiro mestre, que estava e ainda está sempre ao meu lado”. Sobre o que representa a Hamburguesa , hoje, Fábio não tem dúvida. “É um dos melhores bairros de São Paulo. Adoro trabalhar por aqui”.

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