Não queria que o último editorial do ano tivesse quarentena no título, mas com o aumento de casos de Covid-19 em uma pandemia que já causou a morte de mais de 180 mil pessoas no país é difícil pensar em outra palavra. Mais de 180 mil vidas que tinham uma história, sonhos, que amaram e foram amados. Sabemos que existem fatalidades que não podemos controlar, mas ser uma das vítimas dessa crise mundial é algo que não pode perder seu significado.
Com as mortes sendo o assunto diário de todos os jornais, acabamos ficando de certa forma anestesiados em relação à gravidade do problema. Lembro do acidente com um avião da TAM em 2007 que deixou 199 mortos e o impacto que isso causou à época, com tantas vidas perdidas de uma vez. Mesmo cansados dessa quarentena, como não se chocar com a notícia desta semana após o registro de mais de 900 mortes em um período de 24 horas?
Agora quando deveríamos estar nos preparando para finalizar nossas atividades, passar as festas com a família, viajar sem preocupações, não poderemos viver esses momentos com a leveza e liberdade desejadas. Isso para quem tem um pouco de empatia. Muitos não têm.
Uma multidão esteve na Ceagesp para a visita do presidente Jair Bolsonaro durante a semana. Eu, que acompanhei o evento da área que estava liberada, e não com os outros profissionais da imprensa, consegui ver e ouvir de perto (muito mais do que eu gostaria) comentários minimizando a pandemia. Também ocorreu a hostilização de outros jornalistas, considerados pelo séquito do presidente como inimigos. Sinto informar, mas a verdadeira notícia da semana é que 2018 não acabou.
Além das vidas perdidas, também lamentamos os comércios tradicionais que fecharam as portas, os empregos perdidos e as dificuldades financeiras por toda parte. Conseguimos lançar um projeto, que já estava em andamento antes da crise, para criar uma rede virtual para os comerciantes da região: o Daqui Shop Lapa. Nesse admirável mundo novo, a vida diante das telas, como em Fahrenheit 451, se torna irreversível. Mas ao contrário de afastar, queremos unir e retomar os laços da comunidade.
Diante disso, não gostaria que esse último texto acabasse de forma desesperançosa. Sem adversidades na vida jamais teríamos a oportunidade de evoluir, de nos reinventar. Muitas vezes essa é a única forma de sairmos da zona de conforto ou mesmo de despertar o espírito de solidariedade tão celebrado nessa época do ano. E nada mais democrático que um vírus imprevisível para nos acordar da falsa sensação de segurança e controle. Que 2021 seja um ano melhor, com mais empatia, mais colaboração e tranquilidade.