Vivemos focados no nosso próprio mundo, nossos problemas, naquilo que nos afeta diretamente. Alguns mais egocêntricos, outros com um olhar mais empático, que conseguem compreender e se solidarizar com a dor alheia. É importante fazer o exercício de se colocar em um lugar que não é o seu porque, se tem algo que essa pandemia demonstrou, é que somos muito mais dependentes uns dos outros do que imaginávamos. Precisamos colaborar para manter a taxa de ocupação de leitos longe do limite e nos isolar para evitar a transmissão do vírus para outras pessoas.
É verdade que estamos cansados das limitações e de não poder frequentar os lugares que costumávamos ir. Saudades de ir ao cinema e cansados de ver todo o catálogo dos canais de streaming. Saudades de ir a um parque sem preocupações, como o Villa-Lobos que completou 33 anos esse mês. Estamos com saudades de estar com a família ou estressados com a convivência 24/7. E conviver pode ser muito difícil, especialmente quando estamos o tempo todo em casa e nossa trilha sonora é o barulho de uma obra. Ficamos felizes por termos um emprego, mas cansados com a falta de limite entre o horário de trabalho e de lazer, em um sistema de home office que exige estarmos conectados o tempo todo.
Com todas essas coisas que pesam mais a cada dia, após um ano vivendo nesse “novo normal”, precisamos reconhecer os nossos privilégios. Porque incômodos da vizinhança, cansaço de estar em casa, tédio, vontade de sair, não se comparam à realidade que muitas pessoas vivem hoje: a impossibilidade de pagar seu aluguel, desemprego, dificuldade de comprar alimentos para garantir uma dieta com nutrientes básicos e um confinamento absoluto como na história da Fabiana que contamos nessa edição.
É complicado definir prioridades e grupos que serão contemplados com a vacina quando todos nós precisamos muito dela. A diretriz básica é começar sempre por quem é mais vulnerável, embora a Covid-19 tenha mostrado que mesmo pessoas jovens e saudáveis podem ser vítimas. Após profissionais que atuam na linha de frente, idosos, professores e agentes de segurança que não pararam ou tiveram que trabalhar bem antes de serem incluídos na fila da vacina, agora fica mais delicado escolher quem vai receber as próximas doses. Não podemos deixar que a maior representatividade seja o único guia para a tomada de decisões. É difícil em uma cidade tão gigante olhar para os casos específicos, mas é necessário. E mais grave ainda é ter pessoas com o privilégio de estarem qualificadas para se vacinar que optam por não fazê-lo. Dificilmente vamos vacinar todas as pessoas acima de 18 anos até o fim do ano, mas é isso que precisamos para reconstruir a nossa sociedade.