Rosemari dos Santos Valvassore viveu a vida toda na região, primeiro na Rua Coriolano, na Vila Romana, depois na Rua Blumenau, na Vila Leopoldina, e hoje reside na agitada Rua Carlos Weber, que ao menos antes da pandemia era bastante movimentada. A professora aposentada de português e inglês que deu aulas nas escolas Reynaldo Porchat e Alfredo Paulino tem 74 anos e tanto ela quanto seu marido de 77 anos já tomaram as duas doses da vacina da Covid-19, na UBS Parque da Lapa.
Porém, sua filha Fabiana de 48 anos ainda não, e não há previsão de quando isso irá ocorrer mesmo com o grande impacto que a necessidade de manter o isolamento social tem causado em sua vida.
Fabiana é portadora de uma condição rara, chamada Síndrome de Angelman. Trata-se de uma alteração genética e entre os sintomas estão dificuldades motoras, de aprendizado, episódios de epilepsia e a dificuldade ou ausência da fala.
Fabiana não fala. E seu diagnóstico só foi confirmado quando ela tinha 20 anos, apesar do constante acompanhamento médico. Ela chegou a participar do Projeto Genoma da USP que confirmou o caso dela como portadora da síndrome que atinge uma criança a cada 15 mil nascimentos. Como referência, a Síndrome de Down ocorre uma vez a cada 600 nascimentos.
Mas graças ao empenho de seus pais, Fabiana sempre foi muito ativa, seja em atividades escolares, em uma escola especial localizada no Brooklin para onde a família se deslocava diariamente, ou nas consultas terapêuticas como a de fisioterapia.
Na Rua Blumenau a família vivia em um sobrado, mas com o tempo a mobilidade de Fabiana piorou, com o enrijecimento dos músculos, e ela passou a precisar de uma cadeira de rodas na maior parte do tempo. Isso motivou a mudança para um apartamento na Carlos Weber.
Com a pandemia, as atividades educativas e de saúde que Fabiana frequentava foram suspensas e ela passou a viver em um confinamento quase absoluto. Nem uma simples ida ao mercado é possível, já que Rosemari não consegue fazer com que a filha fique de máscara. A solução é deixar Fabiana no carro, acompanhada, enquanto um dos pais vai às compras, e assim é possível sair pelo menos um pouco do apartamento.
Outro lugar que faz falta é o Sesc Pompeia, onde a família ia frequentemente almoçar. Rosemari levou a filha até o local para mostrar que estava fechado e que por enquanto seus tradicionais almoços não eram possíveis. “Ela não fala, mas entende tudo. Ela gosta de gente, gosta de festa e sente muita falta dessa interação. A atual escola dela até realiza lives na internet, mas ela não quer participar. Ela prefere de forma presencial. Por isso que seria muito importante ela ser vacinada para ao menos a gente conseguir sair um pouco”, conta a mãe.
Rosemari tentou incluir a filha na chamada “xepa da vacina”, mas até o momento ela não foi convocada para se imunizar, embora exista a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei 13.164/ 2015) que garante atendimento prioritário às pessoas com deficiência em situações de risco, de emergência ou estado de calamidade pública.
Na terça-feira (20) o Governo do Estado anunciou que irá iniciar a vacinação de pessoas com Síndrome de Down, pacientes com doenças renais crônicas e transplantados a partir do dia 10 de maio, considerando esse público como mais suscetível à Covid-19.
Vivendo uma crise sanitária que pode afetar de forma grave ou fatal até pessoas sem nenhuma comorbidade, e com um estoque de vacinas muito inferior ao necessário, é difícil elencar prioridades de quem deve receber as doses. Mas Rosemari destaca que pessoas com diversas síndromes raras existem, caso de sua filha, e deveriam ser consideradas nos calendários para que, mesmo com as dificuldades a que todos estamos submetidos, tenham alguma qualidade de vida.