Boa vizinhança

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É estranho pensar que parte das pessoas que vivem em prédios muitas vezes não conhecem os vizinhos que moram no apartamento ao lado. Com exceção dos breves encontros no corredor ou viagens de elevador compartilhadas, pouco se sabe da vida de quem divide o mesmo endereço que você.

Eu, entregando minha idade, devo ser das últimas gerações que quando criança brincava na rua (não com liberdade total e sempre com um adulto de olho. A violência já era uma realidade). Mas todos os vizinhos se conheciam, se ajudavam. Eram os primeiros a serem acionados quando algum problema ocorria. A vida em condomínio que tinha tudo para estreitar os laços entre as pessoas parece causar o efeito contrário. A forma de viver também é diferente. Hoje há uma grande rotatividade. Sempre tem alguém mudando para um apartamento maior com a chegada dos filhos ou menor com a saída deles. Difícil encontrar quem tenha os mesmos vizinhos há mais de 20 anos.

Nostalgia à parte, o tema de hoje não são os bons vizinhos, mas justamente o oposto. Todo mundo, em casa ou prédio, tem algum vizinho que faz festas em casa. Na pandemia esse tipo de evento, o único não fiscalizado pelos órgãos públicos, foi bem frequente. Se a festa for algo excepcional, a maioria dos moradores entende. Aceitam sacrificar o sono pela felicidade alheia. Mas quando isso ocorre todos os finais de semana, a convivência deixa de ser boa.

Relatos desse tipo são frequentes nas reuniões dos Conselhos Comunitários de Segurança. No caso de Perdizes, existem alguns agravantes como abrigar grandes universidades e um estádio. Apesar de óbvia a vocação desses espaços para aglomerações e barulho, não é justa a premissa que diz “os incomodados que se mudem”. É necessário um grande esforço e recursos para manter uma coexistência saudável.

Outro caso de problema de vizinhança ocorre na Vila Leopoldina. Os moradores, embora contem com toda a estrutura em seus condomínios, se incomodam com problemas de zeladoria e a concentração de pessoas em situação de rua em áreas públicas. A zeladoria é um serviço que precisa ser feito. Temos orçamento para isso. Já em relação ao acolhimento das pessoas, sabemos que isso só pode ser feito de forma voluntária. É assim que deve ser. O incômodo não deveria ser causado por essa visão da realidade. O incômodo deveria estar na grande desigualdade existente na cidade, que faz com que pessoas não tenham um trabalho, que não consigam manter uma moradia digna. A violência que todos temos medo sofrer é também uma consequência dessa desigualdade.

Não podemos fechar os olhos para a raiz do problema e reclamar apenas das consequências que estão na nossa porta.

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