Carta para a menina

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Minha velhinha, minha adorada velhinha, como você é linda, ainda. Você continua como sempre: uma me-nina limpa, cheirosa e meiga. Como é bom estar com você nesses anos de despedida desta existência e, olhe, se o Pai celeste deixar, eu quero reencontrar você numa próxima vida.
Saiba, minha querida, que eu sei que não fui grande coisa para os seus sonhos dos quinze anos. Às vezes, o meu coração se enche de um medo estranho em face do pensamento de que você se tenha arrependido de me ter escolhido… Vejo, hoje, que você podia ter escolhido quem você quisesse, até o cadete-aviador que hoje, talvez, seja um bonito Brigadeiro do Ar!… Ciúmes de velho… Não faz mal: o fato fatíssimo é que você escolheu a mim e me suporta e me ama há quase sessenta anos.
 Minha menina querida, queria dar-lhe flores, muitas flores no próximo dia dos namorados, mas me parece que isso ia parecer meio cafona para os nossos filhos e netos. Então, dou-lhe esta crônica singela e a ofereço aos outros velhinhos para oferecerem-na às suas próprias velhinhas, com as modificações que quiserem.
Ah! Que saudades eu tenho daqueles dias felizes da minha mocidade e da sua mocidade. Tempos imortais para as nossas almas. Eu, moço. Você, moça. Eu, forte como um touro vermelho. Você, bela como uma flor, como um bibelot de louça. Eu tinha medo de machucá-la, como tenho até hoje. Você é frágil e dedicada, como tudo que é belo!
Minha velhinha amada, sofro só em pensar em perdê-la. Tenho pedido ao Pai que me leve antes de você. Sei que você resistirá mais, porque eu sempre soube que a sua fraqueza é pura força e que os filhos serão muito mais dedicados e farão fortaleza ao redor de você… mas, isso está longe! Vivamos, agora, as bênçãos dos anos! Colhamos as florzinhas que pudermos e louvemos a Deus! 

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